domingo, 17 de dezembro de 2017

Numa gélida noite



Numa gélida noite, olhava desgrenhado com o frio, para o fundo de uma rua. Fixei a luz de um candeeiro lá ao fundo… e de repente, veio-me à ideia de como seria eu mesmo, ali, naquele mesmo lugar, naquele instante. É como que se alguém tirasse uma foto por trás de nós, mas cujo obturador está cá dentro! Uma leve sombra… um suspiro, um pressagio autêntico de que algo está connosco. Quando fecho os olhos, observo-me… Um corpo ali prantado. O ar que exalo a 37 graus deixa uma névoa brilhante no frio da noite. Mais brilhante até, porque a lua ilumina aquela condensação mágica até longe… e ali fico. Observando agora outras coisas, que o físico DELE não consegue entrever. 
 Vejo como a minha Alma me vê. De longe e de perto. Sinto como que uma vontade extraordinária de trocar de posição… e… sinto isso! Quiçá um recado em noite de lua cheia. Quiçá uma vontade que deambula no espaço entre eu e o mortal. Eu? Ainda agora sei quem era… Mas agora não sei quem quero ser… Se Alma se mortal… pois que, quando um mortal e a sua alma olham no mesmo sentido, há uma simbiose perfeita. Acarretam sentidos mútuos… será? Será que a Alma sente o que estou a sentir? Tudo é hollywoodesco. Perfeito!

Encontrei-te!

Sem pedir, presenteaste os meus defeitos com virtudes e alentos. O detalhe está nos teus gestos, nas palavras, que são sentidas de quando em vez no sitio mais intimo do nosso Eu. As vozes em uníssono a silabar um sim, mas repreendidas com um olhar, porque o sim era de cada um, sem saber que o iam declarar… suspiros arquejantes e silêncios que se dizem apenas com um olhar!

Odeio-te!

Agora tenho a certeza que as almas gémeas nascem juntas… e trocar contigo não dá minha Alma… a tua reacção a este desabafo é intemporal, incomensurável… e eu por cá, vou morrendo… por ti!

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

o tempo que nos move...




Sabemos que o tempo está aqui connosco, coabitamos com ele. Por vezes é motivo para uma boa tertúlia à moda antiga, onde tempo é coisa parca para tanta conversa interessante. Podemos navegar de uma forma intemporal conseguindo manter a mente abstrata das perniciosidades que nos rodeiam, podemos sorrir, podemos demorar um abraço, podemos eternizar um beijo! O tempo, não é mais do que um amigo sensível. A sua voz, ora de barítono, ora de tenor, é capaz de nos moldar a conceção do incerto e do certo, do amor e do ódio, do desejo e da impotência, é capaz de voar com a nossa mente até onde essa amizade começou, sem que para isso seja necessário pedir autorização. E bem lá no fundo, só quer o nosso bem-estar, alegrar o nosso dia, captar um momento e com ele, sorrir. E quantos sorrisos cabem num pedaço de tempo? Cabem muitos. Cabem aqueles que conseguirmos perdoar – com o passar dos anos, acredito que cada um de nós reaprenderá a sorrir todos os dias – cabem sorrisos cobertos de alegria e de desilusão. Sim, desilusão, daquelas deceções que o tempo, o nosso amigo sensível, se encarrega de inflamar as nossas mentes de quando em vez, para nos moldar o ego. Tem tanto de impiedoso e insensível, como de permissivo e humano. Impiedoso na medida em que talha o rosto de cada um, como lhe dá na real gana e de uma forma irreversível, não sendo pois, possível, escolher que parte de nós suportará a maior parte da marca da sua passagem, por outro lado, a forma permissiva com que encaramos isso, é a simbiose perfeita dessa passagem, tangível apenas por aqueles que conseguem sentir, por dentro, a importância de sorrir todos os dias, pois que, por fora, é o tempo quem sorri por nós!

domingo, 24 de setembro de 2017

Um quarto na pensão



A porta clama devagar a sua velhice com um chiar prolongado, e deixa entrar o som de um par de saltos altos que fazem ranger o velho chão de madeira na pensão. Vencido pelo absinto, estou caído sob um colchão de molas calejado que me afunda no centro da cama. A luz é reduzida e oiço a ignescência de um fósforo a acender uma vela! Ao ouvido uma voz quente e mélica sussurra-me o refrão da última música que tinha ouvido no bar ao som do piano. Lembro-me que a dancei com uma mulher linda, mas não lhe perguntei o nome. Recebo um abraço e percebo que é a mesma pessoa. Delicadamente desce a sua mão sob a minha fronte, fecha-me os olhos e acaricia-me os lábios com os seus dedos compridos. Não tinha unhas de gel, claramente eram dedos de pianista. Tenho a sensação que a última música que dançámos foi tocada por alguém do bar para que ela a dançasse comigo. E retomámos o momento… As palavras eram gestos, e os nossos corpos juntaram-se num só em busca do ruído da eloquência. De braços entrelaçados, perfumámos o corpo todo lingual e os dedos olhavam tudo por igual. Desejámos tudo em silêncio e só quebrámos a regra quando atingimos simultaneamente o orgasmo. Foi exímio. Inesperadamente cai uma lágrima do seu rosto que sinto cair na minha mão, ao mesmo tempo que a sua mão me cobria a boca evitando perguntas. Sosseguei porque senti nos seus lábios um sorriso confortante, e descansámos os dois corpos forasteiros lado a lado como se sempre se tivessem amado!

- “São onze horas e trinta minutos”, o meu relógio para invisuais acorda-me.

Ao meu lado encontro um papel em braille:
- As notas do piano foram as palavras que nos juntaram.
Obrigada pela noite.